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O Criador e a Criatura – O Dilema das Redes

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EU SEI QUE TOMEI ALGUMAS DECISÕES RUINS RECENTEMENTE, MAS GARANTO QUE MEU TRABALHO VOLTARÁ AO NORMAL. ESTOU MUITO ENTUSIASMADO E CONFIANTE COM A MISSÃO. E QUERO AJUDÁ-LO

PARE, DAVE.

PODE PARAR, POR FAVOR?

PARE, DAVE.

PODE PARAR, DAVE?

PARE, DAVE. TENHO MEDO. TENHO MEDO, DAVE.

MINHA MENTE ESTÁ SUMINDO.

POSSO SENTIR….

 

Talvez, alguns de vocês, quem sabe os mais aficionados por cinema, se lembrem desse pedido contundente e emocionado dirigido à Dave.

O pedido se inicia com um “por favor”, depois apela para um sentimento, nada mais nada menos do que o medo, segue revelando que sua mente está enfraquecida e, finalmente, explicita com clareza algo profundamente humano, que é a capacidade de sentir.

O pedido dramático em favor de “sua vida” é feito por Hall, o computador, a Dave, o astronauta que está prestes a desativá-lo (cena do filme 2001: Uma Odisseia no Espaço).

Trazer à lembrança esta obra prima de Stanley Kubrick (1968), no momento em que procuramos refletir sobre o recente filme O Dilema das Redes, mostra quanto a questão sobre os avanços tecnológicos e possíveis consequências para a humanidade vêm há muito nos inquietando.

Nesse contraponto entre os dois filmes há algo extremamente importante a ressaltar: 2001 – Uma Odisseia no Espaço é um aterrorizante e premonitório filme de ficção cientifica. Já O Dilema das Redes é um documentário e, como tal, se baseia em fatos reais.

Nesse caso, em particular, O Dilema das Redes trata inicialmente de forma amena as reflexões de dois jovens que construíram os inúmeros aplicativos eletrônicos que fazem parte da vida diária de todos nós. O clima ameno logo desaparece quando os jovens apresentam as inquietações que surgiram a partir de suas “invenções”.

E, pasmem, eles nos dizem, sem titubear, que a presença dos aplicativos [1], estes que lançamos mão a todo momento, nos leva paulatinamente a perder o que temos de mais precioso: nossa liberdade de tomar decisões.

O Dilema das Redes, pouco a pouco se transforma em uma história de terror, na qual nós todos, sem exceção, somos os personagens que participam do enredo.

O filme nos alerta, com veemência, para a ameaça existencial que paira sobre nós , desde que o mundo virtual e os instrumentos criados por eles passaram a fazer parte de nossa vida intima e cotidiana.

O documentário tira nosso chão ao mostrar que hoje, em nossa interação com as redes sociais[2], somos um produto, ou seja, não mais ocupamos o lugar de sujeitos  de nossas próprias ações.

Diferente de Hall, o computador de Kubrick, ou de Frankenstein, o monstro criado pela literatura de Mary Shelley em 1823, a internet e suas redes sociais são imortais.  Não há como planejar uma guerra para destruí-la.

Com esse alerta em mente, os jovens criadores apresentam, para alivio de todos nós, a solução para deter o avanço desenfreado das redes.

Para esse mundo sem contorno das redes sociais e excessivamente perigoso para nossas mentes, há algo humano, excessivamente humano que nos ajudou a construir as civilizações, que devemos mais uma vez  lançar mão. A LEI.

E o que é a lei?

Respondendo essa pergunta com uma resposta simplificada, Lei é  um preceito que regula a sociedade. É ela que define nossos direitos e deveres e alinhava como deve ser a conduta de cada um de nós garantindo, assim, a convivência harmoniosa entre os semelhantes.

Caminhando sobre os trilhos da psicanálise, encontraremos em 1897, em uma das famosas cartas a Fliess, as observações de Freud com base na análise de seus primeiros pacientes e sua auto análise, onde assinala que “o pai proíbe a criança de realizar o desejo incestuoso em relação à mãe”.

Aqui, a primeira lei, a mais psicanalítica de todas, a lei estruturante que oferece o norte ao desenvolvimento do sujeito e nas relações primárias e que será solo para o caminho pelo qual se construirão as civilizações.

E assim, observamos que nos dias atuais, onde a vida humana se expandiu para o mundo virtual, precisamos da LEI, mais do que nunca, para dar conta de nossa jornada.

 

[1] Programas indispensáveis em qualquer smartphone. São eles que dão a “inteligência” ao seu celular e garantem funções únicas e extremamente úteis sempre na palma da sua mão.

[2] Rede social é uma estrutura social composta por pessoas ou organizações, conectadas por um ou vários tipos de relações, que compartilham valores e objetivos comuns. 

*Cintia Buschenelli é membro associado da SBPSP. 

Crédito: Alphonse Baudin (1811-1851), por Aimé Millet. 



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